terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Transtornos globais de desenvolvimento

O texto nesta postagem corresponde ao capítulo 2 do fascículo: A educação especial na perspectiva da inclusão escolar: transtornos globais do desenvolvimento, de autoria de José Ferreira Belisário Júnior e Patrícia Cunha, elaboração da Universidade Federal do Ceará (UFC), e utilizado na formação a distância do professor de AEE. O fascículo será publicado pelo Ministério da Educação (MEC) /Secretaria de Educação Especial (SEESP) e será disponibilizado em http://portal.mec.gov.br/
 
  
 



TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO
 
  O conceito de Transtornos Globais do Desenvolvimento surge no final dos anos 60, derivado especialmente dos trabalhos de M. Rutter e D. Cohen. Ele traduz a compreensão do autismo como um transtorno do desenvolvimento.
O autismo é explicado e descrito como um conjunto de transtornos qualitativos de funções envolvidas no desenvolvimento humano. Esse modelo explicativo permitiu que o autismo não fosse mais classificado como psicose infantil, termo que acarretava um estigma para as famílias e para as próprias crianças com autismo. Além disso, o modelo permite uma compreensão adequada de outras manifestações de transtornos dessas funções do desenvolvimento que, embora apresentem semelhanças, constituem quadros diagnósticos diferentes.
A compreensão dos transtornos classificados como TGD, a partir das funções envolvidas no desenvolvimento, aponta perspectivas de abordagem, tanto clínicas quanto educacionais, bastante inovadoras, além de contribuir para a compreensão dessas funções no desenvolvimento de todas as crianças.
O Transtorno Global do Desenvolvimento não diz respeito apenas ao autismo. Sob essa classificação se descrevem diferentes transtornos que têm em comum as funções do desenvolvimento afetadas qualitativamente. São eles:
• Autismo;
• Síndrome de Rett;
• Transtorno ou Síndrome de Asperger;
• Transtorno Desintegrativo da Infância;
• Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra especificação.


1. Autismo:
De acordo com o DSM.IV, podemos descrever algumas características que podem ser manifestadas pelas pessoas com autismo.
O autismo se caracteriza pela presença de um desenvolvimento acentuadamente prejudicado na interação social e comunicação, além de um repertório marcantemente restrito de atividades e interesses. As manifestações desse transtorno variam imensamente a depender do nível de desenvolvimento e idade.
Os prejuízos na interação social são amplos, podendo haver também prejuízos no comportamentos não verbais (contato visual direto, expressão facial, gestos corporais) que regulam a interação social. As crianças com autismo podem ignorar outras crianças e não compreender as necessidades delas.
Os prejuízos na comunicação também são marcantes e podem afetar habilidades verbais e não verbais. Pode haver atraso ou falta total de desenvolvimento da linguagem falada. Naqueles que chegam a falar, pode existir prejuízo na capacidade de iniciar ou manter uma conversação, uso estereotipado e repetitivo da linguagem ou uma linguagem idiossincrática (uso peculiar de palavras ou frases não possibilitando entender o significado do que está sendo dito).
Quando a fala se desenvolve, o timbre, a entonação, a velocidade, o ritmo ou a ênfase podem ser anormais (ex.: o tom de voz pode ser monótono ou elevar-se de modo interrogativo ao final de frases afirmativas). As estruturas gramaticais são freqüentemente imaturas e incluem o uso estereotipado e repetitivo (ex.: repetição de palavras ou frases, independentemente do significado, repetição de comerciais ou jingles).
Pode-se observar uma perturbação na capacidade de compreensão da linguagem, como entender perguntas, orientações ou piadas simples. As brincadeiras imaginativas em geral são ausentes ou apresentam prejuízos acentuados.
Existe, com freqüência, interesse por rotinas ou rituais não funcionais ou uma insistência irracional em seguir rotinas. Os movimentos corporais estereotipados envolvem mãos (bater palmas, estalar os dedos), ou todo o corpo (balançar-se, inclinar-se abruptamente ou oscilar o corpo), além de anormalidades de postura (ex.: caminhar na ponta dos pés, movimentos estranhos das mãos e posturas corporais).
Podem apresentar preocupação persistente com partes de objetos (botões, partes do corpo). Também pode haver fascinação por movimentos (rodinhas dos brinquedos, abrir e fechar portas, ventiladores ou outros objetos com movimento giratório).


2. Síndrome de Rett:
A Síndrome de Rett foi identificada em 1966 por Andréas Rett, tendo ficado mais conhecida após o trabalho de Hagberg.
Do ponto de vista clínico, a Síndrome de Rett pode ser organizada em quatro etapas,
de acordo com Mercadante (2007), conforme segue:
Estagnação precoce:
• Dos 6 aos 18 meses, caracterizando-se pela estagnação do desenvolvimento, desaceleração do crescimento do perímetro cefálico e tendência ao isolamento social.
Rapidamente destrutiva:
• Entre o primeiro e o terceiro ano de vida, com regressão psicomotora, choro imotivado, irritabilidade, perda da fala adquirida, comportamento autista e movimentos estereotipados das mãos. Podem ocorrer irregularidades respiratórias e epilepsia.
Pseudoestacionária:
• Entre os dois e dez anos de idade, podendo haver certa melhora de alguns dos sintomas como, por exemplo, o contato social. Presença de ataxia, apraxia, espasticidade, escoliose e bruxismo. Episódios de perda de fôlego, aerofagia, expulsão forçada de ar e saliva.
Deterioração motora tardia:
• Inicia-se em torno dos dez anos de idade, com desvio cognitivo grave e lenta progressão de prejuízos motores, podendo necessitar de cadeira de rodas.
Mesmo com a identificação do gene, os mecanismos envolvidos na Síndrome de Rett ainda são desconhecidos. Reduções significativas no lobo frontal, no núcleo caudato e no mesencéfalo têm sido descritas, havendo também algumas evidências de desenvolvimento sináptico.

3. Transtorno de Asperger:
De acordo com o DSM.IV, as características essenciais do Transtorno de Asperger consistem em prejuízo persistente na interação social e no desenvolvimento de padrões repetitivos de comportamento, interesses e atividades. A perturbação pode causar prejuízo clinicamente significativo nas áreas social, ocupacional ou em outras áreas importantes do funcionamento. podem aparecer e ser reconhecidos. Quando adultos, podem ter problemas com a empatia e modulação da interação social.
Diferentemente do que ocorre no Autismo, não existem atrasos significativos na linguagem. Também não existem atrasos significativos no desenvolvimento cognitivo ou nas habilidades de auto ajuda, comportamento adaptativo (outro que não a interação social) e curiosidade acerca do ambiente na infância.
O Transtorno de Asperger parece ter um início mais tardio do que o Autismo, ou parece ser identificado mais tarde. As dificuldades de interação social podem tornar-se mais manifestas no contexto escolar, e é durante esse período que interesses idiossincráticos (peculiares em relação aos interesses comuns às pessoas) ou circunscritos

4. Transtorno Desintegrativo da Infância:
O Transtorno Desintegrativo da Infância foi descrito pela primeira vez por Heller, em 1908. Foi então denominado "dementia infantilis". Essa definição, entretanto, não corresponde ao quadro, já que as características de perda de memória e de habilidades executivas não são proeminentes e não há causa orgânica do prejuízo.
Posteriormente, é introduzido na classificação psiquiátrica, categorizado como Transtorno Global do Desenvolvimento em função da perda das habilidades sociais e comunicativas proeminentes. É um transtorno extremamente raro.
Nesse transtorno, não há deterioração continuada; após a regressão inicial, chega-se a um estado estável, mas com grande impacto durante toda a vida.

5. Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra especificação:
Essa é uma categoria diagnóstica de exclusão. Alguém pode ser assim diagnosticado se preencher critérios no domínio social e apenas mais um dos dois outros domínios. Podem se considerar também pessoas que possuam menos do que seis sintomas no total requerido para o diagnóstico do autismo ou idade de início maior do que 36 meses.


6. Espectro Autista
Em 1979, estudos de Wing e Gould deram origem ao conceito de Espectro Autista. Ao estudarem a incidência de dificuldades na reciprocidade social, perceberam que as crianças afetadas por essas dificuldades também apresentavam os sintomas principais do autismo. A incidência foi praticamente cinco vezes maior do que a incidência nuclear do autismo.
Portanto, são crianças afetadas por dificuldades na reciprocidade social, na comunicação e por um padrão restrito de conduta, sem que sejam autistas, propriamente ditas, o que permitiu atenção e ajuda a um número maior de crianças.
O Espectro Autista é um contínuo, não uma categoria única, e apresenta-se em diferentes graus. Há, nesse contínuo, os Transtornos Globais do Desenvolvimento e outros que não podem ser considerados como Autismo, ou outro TGD, mas que apresentam características no desenvolvimento correspondentes a traços presentes no autismo. São as crianças com Espectro Autista.












Um comentário:

  1. Sua publicação foi muito boa...
    Mantenha seu bog atualizado... ele é uma boa referência.
    Parabéns!

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